23
Set 09
Pense em alguém que seja poderoso.
Essa pessoa briga e grita como uma galinha ou olha e silencia, como um lobo?
Lobos não gritam.
Eles têm a aura de força e poder.
Observam em silêncio.
Somente os poderosos, sejam lobos, homens ou mulheres, respondem a um ataque verbal com o silêncio.
Além disso, quem evita dizer tudo o que tem vontade, raramente se arrepende por magoar alguém com palavras ásperas e impensadas.
Exatamente por isso, o primeiro e mais óbvio sinal de poder sobre si mesmo é o silêncio em momentos críticos.
Se você está em silêncio, olhando para o problema, mostra que está pensando, sem tempo para debates fúteis.
Se for uma discussão que já deixou o terreno da razão, quem silencia mostra que já venceu, mesmo quando o outro lado insiste em gritar a sua derrota.
Olhe.
Sorria.
Silencie.
Vá em frente.
Lembre-se de que há momentos de falar e há momentos de silenciar.
Escolha qual desses momentos é o correto, mesmo que tenha que se esforçar para isso.
Por alguma razão, provavelmente cultural, somos treinados para a (falsa) idéia de que somos obrigados a responder a todas as perguntas e reagir a todos os ataques.
Não é verdade!
Você responde somente ao que quer responder e reage somente ao que reagir.
Você nem mesmo é obrigado a atender seu telefone pessoal.
Falar é uma escolha, não uma exigência, por mais que assim o pareça.
Se escolher o silêncio verá que, muitas vezes, ele pode ser poderoso...
publicado por encontromarcado às 20:54

13
Set 09

 

 
Abrir a mente para novas falas, a alma para abrigar o “outro”, libertar-se de convenções e de formatos preestabelecidos, enfim, tirar os sapatos, que protegem o homem, mas também isolam e evitam o contato com um chão de muitas verdades e possibilidades. Foi traçando a rota seguida por Abraão, patriarca das três religiões monoteístas – cristianismo, judaísmo e islamismo – que o rabino Nilton Bonder, com os pés no chão, aprendeu que mais importante que o destino da viagem é o caminho percorrido. Em 2006, Bonder foi convidado a participar, ao lado de 23 representantes de diferentes países e religiões, de uma peregrinação pelo Oriente Médio: é O Caminho de Abraão, projeto do Departamento de Mediação de Conflitos da Universidade de Harvard, que visa a apoiar a abertura de uma extensa rota de turismo histórico e cultural para refazer a jornada deste importante personagem pela região - que vive em tensão permanente - há cerca de quatro mil anos. Em Tirando os sapatos, o rabino relata suas experiências durante a caminhada.
 
O relato é apresentado de duas formas distintas: uma é um diário de viagem, no qual Bonder descreve suas impressões dos locais por que passou e da convivência com o eclético grupo – formado por pessoas de diversas crenças e religiões – com que conviveu, extraído de uma longa entrevista à jornalista Tania Menai. A outra representa a sua viagem espiritual, que mostra suas etapas de estranhamento ao se defrontar, durante a peregrinação, com diferentes significados que a trajetória de Abraão tem para as três religiões.
 
Mais que um destino turístico, O Caminho de Abraão tem o potencial de promover o desenvolvimento comunitário, a formação de lideranças jovens, a preservação do patrimônio histórico e do meio ambiente e uma imagem positiva da região na mídia, destacando a hospitalidade de seu povo e, mais importante, o encontro entre pessoas e o diálogo entre religiões diversas. Diálogo que começou no próprio grupo de Bonder. Apesar de a maioria dos participantes ter uma visão neutra da região, havia quem tivesse definida inclinação pelo mundo árabe: um xeque turco, um padre italiano radicado na Síria e um paquistanês islâmico. Este último nutria opiniões muito radicais sobre Israel e mostrou-se bastante incomodado quando soube que Bonder é judeu.
 
Foi uma viagem de alguma tensão para Bonder, que teve que omitir quase o tempo todo sua condição de rabino para poder circular pela região. A solução para aliviar esta pressão foi não reagir àquilo que o rejeita, abrir-se para o ponto de vista do outro, muitas vezes indo de encontro ao que pensava, incluindo as do paquistanês, de quem, por fim, conseguiu virar colega, após longa troca de idéias.
 
Também foi por meio desta convivência que Bonder ouviu teorias interessantes como a de que os conflitos religiosos no Oriente Médio teriam uma explicação geológica, segundo uma profissional de Harvard: a área é uma área turbulenta, incluindo o Mar Morto, a região mais baixa do planeta. Ali ocorrem muitas movimentações tectônicas devido à presença de um cinturão sísmico. Curiosamente, todas as regiões do mundo com movimentos tectônicos são áreas de alta espiritualidade: a Califórnia, os Andes, o México, o Himalaia. Áreas geologicamente instáveis ativam, no ser humano, a necessidade espiritual. A estabilidade traz acomodação.
 
Diferentemente de um turista comum, o peregrino aprende mais no trajeto: o que importa é estar sempre em movimento, mesmo que não se saiba qual é a chegada, o ponto final da viagem. É durante o caminho que ele aprende a se desfazer da bagagem – que representa, assim como os sapatos, a identidade do indivíduo, uma forma de proteção da pessoa em relação ao desconhecido. O importante aqui é, como fez Bonder, jogar-se na interação com o lugar e, principalmente, com as pessoas. Não ter medo de perder a identidade. É por meio da alteridade, de olhar o mundo pelo olhar do outro, que se pode desfazer de sapatos, bagagens, preconceitos e intolerâncias.
 
Foi a partir desta visão que Bonder identificou como as religiões vêem a importância e a história de Abraão de formas diferentes e desenvolveu o conceito de “paralelismo histórico”. A História não obedeceria necessariamente a uma cronologia rígida, em que um evento vem antes do outro, estabelecendo um único fluxo que comporta uma única verdade: “A História não é tão consecutiva e cronológica como me haviam ensinado e como eu a percebia. Há um paralelismo na História. Coisas acontecem ao mesmo tempo, ou mais do que isso, enquanto coisas estão acontecendo para um grupo estão também acontecendo para o outro. Não há apenas um acontecimento sobre o qual se possa determinar a autoria e patrimônio.”
 
Com 1.200 quilômetros, a rota tem início nas ruínas de Haran, na Turquia, local onde, acredita-se, o patriarca ouviu pela primeira vez o chamado de Deus. E se estende por todo o Oriente Médio, incluindo cidades históricas como Alepo, Damasco, Jericó, Nablus, Belém e Jerusalém, e regiões de grande riqueza natural e cultural como as colinas do Líbano, a região de Ajloun da Jordânia e o deserto de Grajev, em Israel. No trajeto, encontram-se alguns dos locais mais sagrados do mundo. O ponto alto é a cidade de Hebron/ Al Khalil, local do túmulo de Abraão. Futuramente, o caminho será estendido para englobar as idas e vindas de Abraão rumo ao Egito, Iraque e, para os muçulmanos, Meca, na Arábia Saudita. O Caminho de Abraão é um projeto em andamento e mais informações podem ser encontradas em www.abrahampath.org.
 
TIRANDO OS SAPATOS – Nilton Bonder - Editora Rocco - 2008
 
 
 
 
publicado por encontromarcado às 23:50

11
Set 09

 

 
 
A mais consciente das demandas é a de poder atender ao “desejo”, mas limitar-se à “necessidade” por obra da maturidade pessoal
 
Por Eugenio Mussak
 
Demanda significa busca, interesse por um produto ou por um serviço por parte de um segmento do mercado. Parece simples, mas é um conceito tão importante na atualidade, que merece um pouco mais de reflexão.
 
Antes, é importante definir outras duas palavras: necessidade e desejo. Necessidade é uma força que surge para atender a uma exigência orgânica, vital para o organismo, seja de uma pessoa, de um conjunto de pessoas, de uma empresa, de uma sociedade, de um país. De acordo com o psicólogo nova-iorquino Abraham Maslow (1908-1970) todos nós temos necessidades, e estas estão classificadas em cinco tipos, e nós só nos esforçamos para atender a uma necessidade quando a anterior, mais importante, já estiver atendida. São as necessidades: fisiológicas (comer, ter calor, excretar...), segurança (física e emocional), sociais (principalmente a de pertencer a grupos de semelhantes), afeto (sentir-se amado) e, por último, o autodesenvolvimento (que implica em conquistas intelectuais, principalmente).
 
Com relação aos desejos, eles não são uma exigência orgânica, e sim uma exigência psicológica, em que os determinantes são principalmente culturais. Poderíamos dizer que um desejo é uma necessidade cultural. Por exemplo, eu posso estar “necessitando” de um automóvel, e “desejando” um Mercedes Benz. Desejos e necessidades não são, portanto, excludentes, mas é necessária uma boa dose de consciência e maturidade para entender a diferença.
 
E finalmente chegamos à demanda novamente. Trata-se de uma relação adequada entre o binômio “necessidades e desejos” e a condição financeira para satisfazê-lo. Em outras palavras, de nada me adianta necessitar ou desejar se eu não tiver o dinheiro necessário e suficiente para atender à necessidade ou ao desejo. Eu necessito de um carro, desejo um Mercedes, mas “demando” um Celta básico.
 
Por isso a indústria interessa-se pelas demandas do mercado. As empresas de publicidade dizem que a indústria está atendendo aos nossos “desejos”, mas na verdade está atendendo às nossas “demandas”.
 
A ansiedade, estado emocional tão presente no homem contemporâneo, deriva da distância entre a necessidade e o desejo, enquanto a angústia vem da distância entre o desejo e a demanda. O drama central do homem atual não está em desejar o que não precisa, mas em desejar o que não pode demandar. Quem deseja o que não necessita pode ficar ansioso, quem deseja o que não pode demandar ficará angustiado.
 
Necessidades, desejos e demandas. Três características do homem contemporâneo, que viverá melhor quanto mais equilíbrio entre elas conseguir estabelecer. Poder conjugar mais vezes o verbo desejar do que o verbo necessitar é uma conquista, que depende de dedicação, preparo, tempo. Há uma certa autoridade vitoriosa em poder atender aos desejos com a mesma fleuma que se atende às necessidades, e dessa forma manter completo controle sobre as demandas pessoais.
 
Mas a mais consciente das demandas é a de poder atender ao “desejo”, mas limitar-se à “necessidade” por obra da maturidade pessoal. Necessitar de um automóvel, poder comprar o modelo de luxo, mas optar pelo modelo intermediário, confortável e não exibicionista. Manter para si o poder da autoestima, e não entregá-lo aos outros, necessitando da admiração alheia sobre nosso sucesso e poder de compra. Esse é o grande e verdadeiro sonho de consumo.
publicado por encontromarcado às 21:53

10
Set 09

 

 
Uma das características do poder é imantar em muitos que o ocupam a pretensão de nele se perpetuar. Nada mais trágico para tais pessoas do que sua perda: ficam com baixa autoestima, sentem-se abandonadas pelos antigos correligionários, lamentam já não usufruírem dos privilégios e das mordomias de outrora. Daí o empenho de tantos políticos para se perpetuarem no poder. Ao se defender no Senado, Sarney gabou-se de estar nele há 55 anos!
 
A questão do poder desponta com o surgimento da cidade-estado, no início do IV milênio a.C. É quando o ser humano se desprende do ciclo da natureza. Já não funda sua identidade nos vínculos comunitários da sociedade agrária. Sua consciência se personaliza, ele se torna senhor do próprio destino, livre das mutações ecológicas que antes criavam nele a sensação de fatalidade.
 
A vida, como fenômeno biológico, adquire progressivamente contornos históricos. O ser humano percebe-se como sujeito, ator social, dotado de consciência da responsabilidade e capacidade de interferir nos rumos da natureza. As provisões já não dependem apenas da coleta e da extração; surge a atividade produtiva. O mundo deixa de ser uma realidade dada; passa a ser transformado e construído.
 
A fundação da cidade-estado, ao inverter a relação do ser humano com a natureza, o faz perceber que não é mais ele que deve se adaptar a ela; ela é que deve se submeter à vontade dele. A invenção do tijolo, como o comprova o episódio da Torre de Babel (Gênesis 11), permite ao ser humano fabricar a base material do mundo. A produção em série o livra dos condicionamentos ambientais e climáticos.
 
Assim, altera-se a função da divindade, à qual natureza e humanidade estavam implacavelmente sujeitas. Antes, os deuses atuavam movidos por forças obscuras que escapavam do controle humano. Agora, são vistos como fundamento e reflexo da hierarquia que caracteriza a cidade-estado. O rei é tido como mediador entre as ordens celestial e terrena. Ele interfere, não apenas na natureza, mas também na história.
 
Embora ele seja revestido de sacralidade, as leis que promulga já não decorrem da imposição dos deuses. São obra humana, suscetível de limitações e erros, interpretações e questionamentos. E a morte, até então encarada como inevitável degradação ou acidente ditado pelo ciclo da natureza, passa a ser encarada pela ótica da tragédia.
 
A história do rei sumério Gilgamesh ilustra esse atávico apego de muitos ao poder. Ela chegou até nós através da Epopéia, redigida em idioma acádio numa tábua de argila do século VIII a.C. Governante da cidade-estado de Uruk, na Mesopotâmia (atual Iraque), Gilgamesh teria vivido em 2650 a.C. A lista sumeriana dos reis o aponta como o quinto da primeira dinastia. Sua função mítica associa-se ao novo olhar sobre o poder: o supremo grau a que pode ascender uma pessoa, comparada aos deuses, e a morte passa a ser considerada inaceitável, pois deuses não morrem...
 
Gilgamesh se queixa de que, ao criar os seres humanos, os deuses os fizeram mortais e reservaram para si o privilégio da imortalidade. Revolta-se ao descobrir que as funções de poder são perenes, os homens que as ocupam, não.
 
Por sua vez, os cidadãos de Uruk reclamam da tirania de Gilgamesh. Criticado por seus súditos, ele sente a solidão do poder. Necessita de um amigo, um alter-ego, o que não encontra em Uruk. Fica sabendo, por um caçador, da existência de Enkidu, que vive no deserto e comparte a vida dos animais selvagens. É o homem que procurava. Confrontam-se as duas violências: a da natureza (Enkidu) e a da cidade-estado (Gilgamesh). Este envia uma comitiva a Enkidu com a missão de trazê-lo do mundo rural ao mundo urbano.
 
Após Enkidu transar com uma prostituta, os animais do deserto já não identificam nele um igual e passam a temê-lo. Como em muitos mitos, inclusive no Gênesis, é a mulher que introduz o homem no discernimento e na vida civilizada. Enkidu encontra Gilgamesh ao entrar na cidade; surge entre os dois uma profunda amizade. Unidos, sentem-se tão fortes que desafiam os deuses. A aliança entre eles reforça o apego ao poder. À perenidade soma-se a onipotência. Porém, Enkidu se enferma e morre. O imprevisto acontece.
 
Gilgamesh, solitário, se revolta. Recusa-se a aceitar a morte. Ele se torna "o grande homem que não quer morrer", diz o texto. Decide partir e aprender com Uta-napishti - único sobrevivente do dilúvio -, a receita da vida sem fim. O poderoso não admite que a morte o destrone do poder.
 
Shamash, o deus-Sol, o adverte: "Você jamais encontrará a vida sem fim que procura". Gilgamesh não se conforma de, após a morte, encontrar apenas um estado de inanição e sono sem fim. Uta-napishti insiste com Gilgamesh para que ele admita não merecer dos deuses o privilégio da imortalidade.
 
O poder pode tudo, exceto evitar que os poderosos sejam "derrubados de seus tronos e, pela morte, despedidos com as mãos vazias", como canta Maria no Magnificat (Lucas 1, 46-55).
 
[Autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros.
Copyright 2009 - FREI BETTO - É proibida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização. Contato - MHPAL - Agência Literária (mhpal@terra.com.br)]
 
* Escritor e assessor de movimentos sociais
 
 
publicado por encontromarcado às 03:21

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